diário de um arquitecto

[proíbido falar de arquitectura]


o abraço...

Quanto vive o homem, por fim?
Vive mil anos ou um só?
Vive uma semana ou vários séculos?
Por quanto tempo morre o homem?
Que quer dizer para sempre?

pablo neruda

súplica

Agora que o silêncio é um mar sem ondas,
E que nele posso navegar sem rumo,
Não respondas
Às urgentes perguntas
Que te fiz.
Deixa-me ser feliz
Assim,
Já tão longe de ti como de mim.

Perde-se a vida a desejá-la tanto.
Só soubemos sofrer, enquanto
O nosso amor
Durou.
Mas o tempo passou,
Há calmaria...
Não perturbes a paz que me foi dada.
Ouvir de novo a tua voz seria
Matar a sede com água salgada.

miguel torga

Nem um poema nem um verso nem um canto
tudo raso de ausência tudo liso de espanto
e nem Camões Virgílio Shelley Dante
--- o meu amigo está longe
e a distância é bastante.

Nem um som nem um grito nem um ai
tudo calado todos sem mãe nem pai
Ah não Camões Virgílio Shelley Dante!

--- o meu amigo está longe
e a tristeza é bastante.

Nada a não ser este silêncio tenso
que faz do amor sozinho o amor imenso.
Calai Camões Virgílio Shelley Dante:
o meu amigo está longe
e a saudade é bastante!

josé carlos ary dos santos

no teu poema

No teu poema/Existe um verso em branco e sem medida/Um corpo que respira, um céu aberto/Janela debruçada para a vida./No teu poema/Existe a dor calada lá no fundo/O passo da coragem em casa escura/E aberta uma varanda para o mundo/Existe a noite/O riso e a voz refeita à luz do dia/A festa da Senhora da Agonia e o cansaço/Do corpo que adormece em cama fria/Existe um rio/A sina de quem nasce fraco ou forte/O risco, a raiva, a luta, de quem cai ou que resiste/Que vence ou adormece antes da morte./No teu poema/Existe o grito e o eco da metralha/A dor que sei de cor mas não recito/E os sonos inquietos de quem falha./No teu poema/Existe um cantochão alentejano/A rua e o pregão de uma varina/E um barco assoprado a todo o pano/Existe um rio/O canto em vozes juntas, em vozes certas/Canção de uma só letra e um só destino a embarcar/No cais da nova nau das descobertas/Existe um rio a sina de quem nasce fraco ou forte/O risco, a raiva e a luta de quem cai ou que resiste/Que vence ou adormece antes da morte./No teu poema/Existe a esperança acesa atrás do muro/Existe tudo o mais que ainda me escapa/E um verso em branco à espera do futuro...

É necessário amar,
qualquer coisa, ou alguém;
o que interessa é gostar
não importa de quem.
Não importa de quem,
nem importa de quê;
o que interessa é amar
mesmo o que não se vê.
Pode ser uma mulher,
uma pedra, uma flor,
uma coisa qualquer,
seja lá do que for.
Pode até nem ser nada
que em ser se concretize,
coisa apenas pensada,
que a sonhar se precise.
Amar por claridade,
sem dever a cumprir;
uma oportunidade
para olhar e sorrir.
Amar como um homem forte
só ele o sabe e pode-o;
amar até à morte,
amar até ao ódio.
Que o ódio, infelizmente,
quando o clima é de horror,
é forma inteligente
de se morrer de amor.

António Gedeão

eu quero te dizer...

Muito pra mim é nada Tudo pra mim não basta Eu quero cada gesto Cada palavra Cada segundo da sua atenção Faça isso por mim Leve a dor pra longe daqui Estou cansada de ouvir que eu só sei amar errado Estou cansada de me dividir No que é certo no amor Quem é que vai dizer o que falar? Calar? Querer? Eu quero absurdos Quero amor sem fim Quero te dizer que...
- Eu só sei amar assim...

as palavras

São como um cristal,
as palavras.
Algumas, um punhal,
um incêndio.
Outras,
orvalho apenas.

Secretas vêm, cheias de memória.
Inseguras navegam:
barcos ou beijos,
as águas estremecem.
Desamparadas, inocentes,
leves.
Tecidas são de luz
e são a noite.
E mesmo pálidas
verdes paraísos lembram ainda.

Quem as escuta? Quem
as recolhe, assim,
cruéis, desfeitas,
nas suas conchas puras?

eugénio de andrade

do desassossego...

Para compreender, destruí-me. Compreender é esquecer de amar. Nada conheço mais ao mesmo tempo falso e significativo que aquele dito de Leonardo da Vinci de que se não pode amar ou odiar uma coisa senão depois de compreendê-la. A solidão desola-me; a companhia oprime-me. A presença de outra pessoa descaminha-me os pensamentos; sonho a sua presença com uma distracção especial, que toda a minha atenção analítica não consegue definir.

Se escrevo o que sinto é porque assim diminuo a febre de sentir. O que confesso não tem importância, pois nada tem importância. Faço paisagens com o que sinto.

De resto, com que posso contar comigo? Uma acuidade horrível das sensações, e a compreensão profunda de estar sentindo... Uma inteligência aguda para me destruir, e um poder de sonho sôfrego de me entreter... Uma vontade morta e uma reflexão que a embala, como a um filho vivo...
in O Livro do Desassossego

pa’ que pienses mucho en mí

Si tienes un hondo penar, piensa en mi Si tienes ganas de llorar, piensa en mi Ya ves que venero tu imagen divina Tu parvula boca, que siendo tan niña me enseñó a pecar Piensa en mi cuando sufras, Cuando llores, también piensa en mi, Cuando quieras quitarme la vida No la quiero, para nada Para nada me sirve sin ti. Piensa en mi cuando sufras Cuando llores, también piensa en mi, Cuando quieras quitarme la vida No la quiero, para nada, Para nada me sirve sin ti.

by chavela vargas

em carne viva...

Somos un sueño imposible Que busca la noche Para olvidarse en sus sombras Del mundo y de todo Somos en nuestra quimera Doliente y querida Dos hojas que el viento Juntó en el otoño Somos dos seres en uno Que amándose mueren Para guardar en secreto Lo mucho que quieren Peró qué importa la vida Con esta separación Somos dos gotas de llanto En una canción Nada más Eso somos... Nada más...

by chavela vargas

there's another world... there's a better world

Sing me to sleep Sing me to sleep I'm tired and I, I want to go to bed. Sing me to sleep Sing me to sleep and then leave me alone don't try to wake me in the morning 'cause I will be gone... Don't feel bad for me I want you to know deep in the cell of my heart I will feel so glad to go. Sing me to sleep Sing me to sleep I don't want to wake up on my own anymore. Sing to me Sing to me I don't want to wake up on my own anymore Don't feel bad for me I want you to know deep in the cell of my heart I really want to go. There is another world there is a better world. Well, there must be. Well, there must be. Well, there must be Well, there must be. Well... Bye bye, Bye bye. Bye...

in repeat

"Can you wait there for so long
Can you be there if I fall
Can you fall and stay strong
Can you dry your eyes and laugh
Can you show me your heart once more
Can you breath a new life now
Can I freeze this moment with you
Can my hand fix your heart and you
Did you ever touch the ground
Can we sing 'out of time' in repeat, and look both of us
underneath
or forget and reset
'cause the beat will change your life,
and the sweat will turn you on,
and your veins will shine outside"


the gift...

são coisas assim...

"São coisas assim que tornam o coração
vulnerável: o regresso
das cegonhas brancas,
o comboiinho do ramal de Ceira
que parece de corda, as oito linhas
da Canção Nocturna do Viandante
que Schubert musicou.
Quem dividiu comigo a alegria
merecia ao menos
que o trouxesse à orvalhada
e limpa terra do poema..."

eugénio de andrade

ta-hí